sexta-feira, 8 de outubro de 2010

Analisando Diabo veste Prada e Tempos Modernos


PLANEJAMENTO PROFISSIONAL

Tanto Carlitos como Andréia passaram pelo drama de procurar entrar no mercado de trabalho.
O personagem chapliniano perde o emprego na fábrica. Só desempenhava uma função específica, o que dificultou sua recolocação. Ele não se dá bem em nenhuma outra profissão: é demitido da fábrica de barcos, da loja de departamentos, é  atrapalhado como assistente de mecânico e como garçom. Ele não buscou emprego por vocação, mas por oportunidade. Não tinha um planejamento profissional acerca de sua carreira. Nem, ao menos, conhecia suas habilidades. Só depois de ter passado pelas mais variadas situações é que encontrou algo no qual realmente era bom: interpretar.
Andréia tinha um foco: queria ser jornalista. Em um diálogo no restaurante, o seu pai diz que ela havia passado em direito na Universidade de Stanford, mas que largou a faculdade para fazer jornalismo. Em entrevista com Miranda, Andy ressalta que havia distribuído vários currículos e que só obtivera resposta da Runway e de uma revista sobre carros. O plano era passar algum tempo na Runway para obter alguns contatos com outros editores, porém, à medida que a trama se desenrola, ela parece perder o foco. Mas, consegue retomá-lo ao final, empregando-se em um jornal de renome.
Andréia é diferente de Carlitos no fato de ser qualificada demais para o cargo que iria ocupar na Runway: antes ela fora editora chefe do Diário de Northwestern e ganhou um concurso para jornalistas universitários. Porém, nada entendia sobre moda, nem, ao menos, ouvira falar da empresa onde ira trabalhar ou do nome de sua chefa (inclusive, não fora com roupa adequada para a ocasião). Entretanto, agiu com esperteza suficiente para ressaltar suas qualidades profissionais e pessoais diante de Miranda: inteligência, facilidade em aprender, dedicação.

PLANEJAMENTO EMPRESARIAL

A Runway era bem reconhecida em sua política externa de trabalho, como de um nível grandioso no mercado e qualidade do produto. No discurso de Miranda, ela afirma a missão da empresa: “compromisso com a excelência” e Nigel, antes: “por 72 anos, Runway tem sido mais que uma revista tem sido um modelo de elegância e graça e Miranda Priestly é a melhor guardiã possível desse modelo, mantendo um padrão que inspira pessoas no mundo inteiro”.
Todavia, na política interna havia situações bem diferentes: desorganização estrutural da hierarquia, não existia padrão de tarefas durante a rotina de trabalho; o que em “Tempos Modernos” era exatamente o excesso.
Ninguém havia apresentado a empresa a Andréia, ela desconhecia a hierarquia da empresa tanto que cruzou com o presidente da companhia no elevador e nem sabia quem era. Não existia descrição das funções, divisão precisa das tarefas, instruções claras. Emily apenas havia dito que suas tarefas eram diferentes, mas não se via isso na prática. A protagonista também não conhecia os termos técnicos e os procedimentos adequados. Andy não foi apresentada a filosofia da empresa, senão posteriormente por Nigel: “saiba que você está trabalhando onde lançaram alguns dos maiores artistas do século e o que criaram foi muito mais do que arte porque se vive para isso. Acha que isso aqui é apenas uma revista? Não, não é só uma revista. É um facho brilhante de esperança!” Além de tudo, o clima de rivalidade e pouco companheirismo encontrava-se em toda parte.
Já na fábrica chapliniana, observamos a existência da hierarquia, rígida divisão do trabalho (cada qual fazia apenas uma função). Nada daquilo é por acaso: há a racionalização das operações, em busca da eficácia, a meta da organização era produzir cada vez mais, sem se preocupar com o bem estar dos funcionários no ambiente de trabalho, o lema era executar e executar. O próprio ambiente era organizado pensando na economia de tempo e esforço a fim de agilizar a produção. Os princípios de Taylon pareciam quase que seguidos a risca: planejamento, treinamento, controle e execução.
O contraste com o layout da fábrica em relação ao Café mostra a falta de planejamento: Chaplin não havia recebido nenhum treinamento específico para atender as mesas e o arranjo das mesas dificultava a passagem dos garçons.

DIRIGENTE X LÍDER

 Tanto em “Tempos Modernos” como em “O Diabo Veste Prada” não encontramos uma figura de liderança nas empresas. Assim Pierre Weil define o líder: “é todo o indivíduo que, graças à sua personalidade, dirige um grupo social, com a participação espontânea de seus membros”[1]. O que temos em ambos os filmes é um dirigente, a diferença é grande: “o chefe se contenta com tarefas; o líder consegue entusiasmo, interesse pelo trabalho e cooperação”[2].
Miranda pratica o que Pierre chamaria de “direção autocrática”: “não se importa em saber o que seus subordinados pensam. Ele os trata como simples laicos, dando ordens que devem ser cumpridas sem discussão; faça isso, faça aquilo; é o lema do diretor. É, em geral, uma pessoa irritável, brutal, colérica, egoísta e incapaz de compreender os outros. Não tem, aliás, nenhum interesse nisso”[3]. Diríamos que seu controle é superficial: obedece-se por medo e não por respeito. Uma cena que ilustra isso é logo no início do filme, quando Miranda está para chegar à Runway: todos começam a se trocar e a “maquiar” seu estilo pessoal, a fim de evitar críticas da chefa – por trás, todos tinham um modo de se portar, mas na frente de Miranda, eram outra pessoa. Sua indiferença pela opinião do outro se mostra claramente quando ela reúne seu grupo para discutir as melhorias da revista: não aceita nenhuma das sugestões (nem ao menos, permite que concluam seu raciocínio), exceto as de Nigel.
O modo como Miranda, ou qualquer dirigente comanda sua empresa, provoca reflexos em seus colaboradores: as pessoas imitam inconscientemente seus superiores, ensina Pierre Weil, “quando uma pessoa diz um desaforo a outra e esta pessoa, por diversas razões, não retruca com um desaforo idêntico, ela fica guardando isso dentro de si, quer dizer, fica num estado de tensão tal que, na primeira oportunidade, terá de desabafar, descarregar esta mesma tensão contra outra pessoa. Esta pessoa poderá ser um colega de trabalho, a esposa, o marido, os filhos, o jornaleiro da esquina, o motorneiro do bonde, o motorista do ônibus etc.”[4]. Pode-se suspeitar que o comportamento de Emily para com Andréia e também ao atender aos telefones na empresa, pode muito bem ser reflexo dessa tensão, o mesmo poderíamos pensar sobre as desavenças entre Chaplin e seu colega de trabalho na fábrica.


[1] WEIL, Pierre & TOMPAKOW, Roland. Relações Humanas na Família e no Trabalho. Rio de Janeiro: Vozes, 2005 (53ª Ed.) p. 63.
[2] Idem, p. 64.
[3] Idem, p. 65.
[4] Idem, pp. 71-72.

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