5. O QUE É O SISTEMA LEAN?
Em contrapartida à produção em massa, surgiu a chamada produção enxuta (lean, em inglês). A expressão Lean Thinking (ou Sistema Lean) foi cunhada no final dos anos 80 pelos pesquisadores do International Motor Vehicle Program (IMVP), um programa de pesquisas ligado ao Massachusetts Institute of Technology (MIT) para definir um sistema de produção muito mais eficiente, flexível, ágil e inovador do que a produção em massa, um sistema habilitado a enfrentar melhor um mercado em constante mudança. Em 1990, é publicado o livro “A Máquina que Mudou o Mundo”, por Wornack, Jones e Roos, que, após de uma ampla pesquisa, em mais de noventa plantas de montadoras de veículo, em dezessete países, chegou-se a conclusão que o Sistema Toyota de Produção era o mais eficaz e eficiente.
Tal forma de produção ganhou tanto destaque que surgiram várias nomenclaturas para designá-la. A expressão “Sistema Lean” (Lean Thinking ou Lean Manufacturing) nada mais é que uma denominação genérica para o Sistema Toyota de Produção (STP). Algumas vezes, podem-se referir a ele como ohnoísmo, em alusão ao engenheiro Taiichi Ohno responsável pela criação do método. José Antônio Valle Antunes Júnior e Marcelo Klippel, no prefácio à edição brasileira de “O Modelo Toyota”, elenca uma série de outras nomenclaturas: Produção com Inventário Minimizado; Material de Acordo com o Necessário (ou Material As Needed – MAN); Sistema de Produção com Inventário Minimizado (SPIM); Time Based Manangement (TBM); Construção Enxuta[1]. Outras vezes é comum se usar metonímias: ao invés de descrever o sistema como todo, toma-se alguma de suas ferramentas para caracterizá-lo, assim são utilizados quase como que sinônimos de produção enxuta Just-in-time, kanban ou mesmo Controle de Qualidade Total (CQT ou Total Quality Control) ou ainda Zero Defeito. Também alguns autores o chamam genericamente de Sistema Japonês de Administração de Produção.
O STP consiste na redução do Lead Time, com serviços de maior qualidade, menores perdas e custo o mais baixo possível, visando atender as necessidades do cliente. A lógica “empurrada” da produção de massa agora é substituída pela produção “puxada”: estocar quantidades relativamente pequenas de cada produto e reabastecer as prateleiras com freqüência, baseando-se no que o cliente de fato consome.
Na produção empurrada se observa: programação de produtos totalmente centralizada; muitas tarefas repetitivas e sem agregar valor; pouca preocupação com a qualidade dos produtos; grandes estoques intermediários; muitas perdas.
Já no sistema “enxuto” o objetivo é atender as necessidades dos clientes no menor tempo, com produtos/serviços da mais alta qualidade e no custo mais baixo possível. As pessoas são a chave do sistema, prima-se pela perfeição na entrega de todo e qualquer produto/serviço e busca-se eliminar toda e qualquer perda.
PACE faz uma analogia que torna bem compreensível a idéia do Sistema Lean: “algumas pessoas podem imaginar, outras até recordar, o tempo em que o leiteiro percorria as ruas da cidade e deixava em algum lugar da casa do seu cliente um ou dois litros do seu produto. É fácil deduzir o que ocorria quando o cliente saía para uma viagem de dez dias sem notificar o entregador de leite: retornava no décimo dia e encontrava, pelo menos, dez litros de leite estragados. Outras vezes, a necessidade de consumo diário do produto era superior a um litro, portanto, a quantidade entregue do mesmo era insuficiente. Essas duas situações repetiam-se a cada viagem e a cada aumento da necessidade diária de consumo do cliente, até que este e o entregador reuniram-se e combinaram o seguinte: o produto seria entregue somente quando, no mesmo local da entrega, houvesse uma ficha deixada pelo cliente. Se houvessem duas fichas, seriam entregues dois litros do produto, e assim sucessivamente. No fim do mês, o entregador apresentaria as fichas em seu poder e o cliente o reembolsaria o valor correspondente. Eliminou-se, com isso, o desperdício ou a falta do produto” [2].
6. AS SETE PERDAS
Um dos princípios fundamentais do Sistema Lean é a perseguição contínua e a eliminação de toda e qualquer perda. Todos os componentes do sistema estão intrinsecamente ligados a este princípio. O próprio criador do modelo, Taiichi Ohno, assim o descreve: “tudo o que estamos fazendo é olhar para a linha do tempo desde o momento em que o cliente nos faz um pedido até o ponto quando coletamos o pagamento. E estamos reduzindo essa linha de tempo, removendo as perdas sem valor agregado” [3].
Por que é preciso eliminar as perdas (ou Muda, em japonês)?
Desperdícios geram somente custo e tempo, portanto, não agregam valor (ou seja, a peça não sofre nenhuma transformação). A utilização de recursos excessivos tais como homem, máquina, material e recursos de facilidades geram a superprodução, considerado por alguns pesquisadores como o pior dos desperdícios[4]. A “obsessão” por cortes de custos é tamanha na Toyota que se proíbe tirar impressões coloridas e todo o papel utilizado é reciclável[5].
No sistema de produção em massa, costuma-se fazer a seguinte equação:
CUSTO + LUCRO = PREÇO DE VENDA
Ou seja, as perdas influenciam diretamente no preço final, as quais o cliente acaba pagando. De outra forma, também poderíamos dizer que o preço de venda dependerá da margem de lucro que a organização deseja obter: diminuir o preço equivaleria em diminuir margem de lucratividade.
Já no Sistema Lean, a mentalidade é outra que poderia ser representada na expressão:
PREÇO DE VENDA – CUSTO = LUCRO
O que significa que reduzindo as perdas (Muda), pode-se diminuir o preço, ao mesmo tempo, que se aumenta a lucratividade, visto que o produto/serviço será mais competitivo (acrescentemos a isso mais um agravante: a qualidade do que é produzido).
Ohno estabeleceu sete tipos de perdas principais: superprodução; espera; transporte ou transferência; super processamento ou processamento incorreto; excesso de estoque; deslocamento desnecessário e defeito. LINKER & MEIER acrescentaram um oitavo tipo: a não utilização da criatividade do funcionário[6].
6.1. Superprodução. Significa produzir mais cedo ou em maiores quantidades do que o cliente necessita. Isso gera outras perdas, tais como custo de pessoal, armazenagem e transporte devido a estoque excessivo. O estoque pode ser físico ou um conjunto de informações.
Por exemplo, para alguns estudiosos, o motivo da Crise de 29 teria sido o fato de o mercado não ter conseguido acompanhar o ritmo da produção industrial, gerando acumulação de estoque[7].
6.2. Espera (tempo à disposição). Trabalhadores meramente servindo como vigias de uma máquina automatizada ou tendo que ficar esperando pela próxima etapa do processamento ou próxima ferramenta, suprimento, peça etc., ou ainda, não tendo trabalho por falta de estoque, atrasos de processamento, paralisação do equipamento e gargalos de capacidade.
6.3. Transporte ou transferência. Movimentação de trabalho em processo de um local para outro, mesmo se for a uma curta distância. Movimentação de materiais, peças ou produtos acabados para estocá-los ou retirá-los do estoque ou entre processos.
6.4. Super processamento ou processamento incorreto. Realização de atividades desnecessárias para processar as peças. Processamento ineficiente devido à má qualidade das ferramentas e do projeto do produto, causando deslocamentos desnecessários ou produzindo defeitos. A perda é gerada quando são oferecidos produtos de maior qualidade do que o necessário. Às vezes, “trabalho” extra é realizado para preencher o excesso de tempo em vez de esperá-lo passar.
6.5. Excesso de estoque. Excesso de matéria-prima, estoque em processo ou produtos acabados, causando lead times mais longos, obsolescência, produtos danificados, custos com transporte e armazenagem e atrasos. Além disso, o estoque extra oculta problemas, tais como desequilíbrios na produção, entregas com atraso por parte dos fornecedores, defeitos, paralisação de equipamentos e longos períodos de preparação de equipamento (setup).
6.6. Deslocamentos desnecessários. Qualquer movimento que os funcionários têm que fazer durante seu período de trabalho que não seja para agregar valor à peça, tais como localizar, procurar ou empilhar peças, ferramentas etc. Além disso, caminhar também é perda.
Pierre Weil dá um exemplo interessante de desperdício por movimento inútil: “um carimbador que mantém a almofada do carimbo à distância de um metro produzirá menos visto que para operar com 100 envelopes terá de percorrer com o braço o total de 200 metros, o que seria reduzido a 10 metros se a almofada estivesse ao seu lado” [8].
6.7. Defeitos. Produção ou correção de peças defeituosas. Conserto ou retrabalho, descarte, produção para a substituição e inspeção significam desperdícios de tempo, de manuseio e de esforço. Pensemos nos conhecidos Recall, que muitos fabricantes de automóveis costumam fazer vez por outra: o quanto não se gasta com propaganda, mobilização de funcionários, modificação na rotina de trabalho, sobrecarga etc., sem falar do inconveniente que é para o cliente.
6.8. Não utilização da criatividade dos funcionários. Perda de tempo, idéias, habilidades, melhorias e oportunidades de aprendizagem por não envolver ou não escutar seus funcionários.
Quanto a isso, o Japão tem mostrado grande avanço na aceitação das idéias oriundas dos funcionários, como o demonstra a tabela abaixo:
PROPOSTA DOS EMPREGADOS X ACEITAÇÃO NO JAPÃO[1] | |||
ANO | QUANTIDADE SUGESTÃO | QUANTIDADE SUGESTÃO POR EMPREGADO | % DE ACEITAÇÃO |
1965 | 9.000 | 1,0 | 39 |
1970 | 40.000 | 2,5 | 70 |
1973 | 247.000 | 12,5 | 76 |
1976 | 380.000 | 15,3 | 83 |
[1] SATO CONSULTORIA DE PESSOAL. Kanban – Just in Time Disponível em: <http://www.sato.adm.br/rh/kan_ban.htm> (acesso: 9 de setembro de 2002)
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