SISTEMAS DE INFORMAÇÕES PARA TOMADA DE DECISÕES
Capítulo I: A Empresa e a Importância dos Objetivos
Antônio Carlos CASSARRO inicia sua obra afirmando que “é impossível a qualquer ser humano viver sozinho” (CASSARRO, 2001:1). Analisando sob diversos aspectos podemos constatar a veracidade e o alcance dessa afirmativa. Diferente dos outros animais, o ser humano não possui uma couraça de proteção, garras afiadas ou dentes pontiagudos; pelo contrário, ao nascer, é frágil demais para sobreviver sozinho, sem os cuidados maternos ou de qualquer outro ser humano. O repertório inato no reino animal é suficiente para a sua sobrevivência no mundo, já no caso do ser humano, “um bebê humano, por exemplo, não consegue prover sozinho a sua alimentação, enquanto a maioria dos animais já é auto-suficiente ao nascer. Longos anos haverão de se passar até que o ser humano tenha condições físicas, intelectivas e emocionais para sobreviver em seu ambiente próprio”[1].
O filósofo, teólogo e cronista brasileiro Rubem ALVES escreveu, certa vez, um trecho que ilustra bem a diferença entre o mundo humano e o animal:
Ao longo de centenas de milhares de anos, os animais conseguiram sobreviver por meio da adaptação física. Seus dentes e suas garras afiadas, os cascos duros e as carapaças rijas, seus venenos e odores, os sentidos hipersensíveis, a capacidade de correr, saltar, cavar, a estranha habilidade de confundir-se com o terreno, com as cascas das árvores, com as folhagens, todas essas são manifestações de corpos maravilhosamente adaptados à natureza ao seu redor. Mas a coisa não se esgota na adaptação física do organismo ao ambiente. O animal faz com que a natureza se adapte a seu corpo. E vemos as represas construídas pelos castores, os buracos-esconderijos dos tatus, os formigueiros, as colméias de abelhas, as casas de joão-de-barro... E o extraordinário é que toda essa sabedoria para sobreviver e arte para fazer seja transmitida de geração a geração, silenciosamente, sem palavras e sem mestre. Lembro-me daquela vespa caçadora que sai em busca de uma aranha, luta com ela, pica-a, paralisa-a, arrastando-a então para seu ninho... Ali deposita seus ovos e morre. Tempos depois, as larvas nascerão e se alimentarão da carne fresca da aranha imóvel. Crescerão. E, sem haver tomado lições ou freqüentado escolas, um dia ouvirão a voz silenciosa da sabedoria que habita seus corpos, há milhares de anos: “chegou a hora. É necessário buscar uma aranha...[2].
E conclui dizendo: “O animal é seu corpo. Sua programação biológica é completa, fechada, perfeita. Não há problemas não-respondidos. E, por isso mesmo, ele não possui qualquer brecha para que alguma coisa nova seja inventada. Os animais praticamente não possuem uma história, tal como a entendemos”[3]. Em contraste ao mundo animal, não é o corpo que faz o ser humano, é o homem que faz o seu corpo. Seu mundo é construído através das relações culturais. O antropólogo Roque B. Laraia escreveu que “ao adquirir cultura [o homem] perdeu a propriedade animal, geneticamente determinada, de repetir os atos de sues antepassados, sem a necessidade de copiá-los ou de se submeter a um processo de aprendizado”[4] e, antes disso, o mesmo autor observa que “o homem criou o seu próprio processo evolutivo”[5].
Quando pesquisamos um pouco mais a fundo, a afirmativa inicial de CASSARRO parece ser desmentida pelo chamado “mito da solidão”, defendido por alguns autores no século XVIII, apregoando a auto-suficiência do homem. O homem não precisaria da sociedade para sobreviver. Por sua inteligência, seria capaz de prover a si mesmo o próprio sustento, sem a necessidade de uma economia de mercado ou de uma sociedade industrial. O indivíduo seria capaz de saciar suas necessidades sozinho. O exemplo típico que representa bem essa concepção é o livro do autor inglês Daniel Dafoe, Robinson Crusoé, escrito em 1719.
Crusoé é o único sobrevivente de um naufrágio e vê-se obrigado a viver sozinho, durante vinte e oito anos, em uma ilha, antes de encontrar o índio Sexta-Feira. O romance simboliza a luta do homem só contra a natureza, a reconstituição dos primeiros rudimentos da civilização humana, testemunhada apenas por uma consciência e dependente de uma energia própria[6]. Entretanto, mesmo Crusoé, no seu isolamento, não é um personagem desconectado da sociedade de seu tempo: ele é portador da cultura inglesa, típica de sua época, partilha dos mesmo valores, das mesmas angústias, questionamentos e crenças.
Uma atualização desse mito pode ser vista no filme, do ano 2000, “O Náufrago” (Cast Away), dirigido por Robert Zemeckis, cujo personagem principal, Chuck Noland (interpretado por Tom Hanks), após um acidente com um avião da companhia Fedex, torna-se o único sobrevivente e acaba isolado em uma ilha, onde é obrigado a sobreviver sem nenhuma das "regalias" que existem na vida contemporânea, por quatro anos. A solidão era tamanha que ele precisou criar um amigo imaginário, apelidado de Wilson (na verdade, uma bola de vôlei fabricada pela Wilson Sporting Goods).
O ser humano tem necessidade de relacionar-se. CASSARRO afirma que “mesmo os ditos eremitas sempre procuram estar acompanhados de outros seres vivos, sejam animais ou vegetais” (2001:1).
Por exemplo, o fundador do monasticismo cristão, foi Santo Antão (também conhecido como Santo Antão do Egito, Santo Antão, ou Grande, Santo Antão, ou Eremita, Santo Antão, ou Anacoreta,), no séc. III. A sua vida foi contada por Santo Atanásio de Alexandria, na Vita Antonii perto de 360. Diz-se que, quando tinha cerca de vinte anos, vendeu todos os seus bens, deu o dinheiro aos pobres e retirou-se para viver em uma comunidade local, fazendo-se ascético. Ele passou muitos anos ajudando outros eremitas a dirigir sua vida espiritual no deserto, depois se encerrou no deserto, para viver em solidão absoluta. Conta-se que sua única companhia eram os animais, dentre os quais um javali que ele havia milagrosamente restituído a visão. Por essa razão, em algumas iconografias ele é representado cercado de animais[7].
Outro exemplo da necessidade do ser humano de relacionar-se pode ser lido na biografia de São Jerônimo, sobretudo na Legenda Áurea (livro acerca da vida dos santos compilado pelo dominicano genovês Santiago de la Vorágine no séc. XIII): o tradutor da Bíblia para o latim vulgar, no séc. V, tinha por companhia um leão – constantemente representado ao seu lado na arte cristã.
Para CASSARRO, a razão principal pela qual não podemos viver sozinhos é porque “somos seres, essencialmente, sociais” (2001:1). É no relacionamento com o outro que o ser humano se descobre, cresce, aprende. Na linha dos filósofos do relacionamento, Fábio de MELO afirma: “a presença do outro nos indica o que somos. O encontro nos diferencia num primeiro momento para depois nos congregar. No processo de congregação, somos desafiados a unir o que somos àquilo que os outros não são. O contrário também é verdadeiro. Unimos o que ainda não somos àquilo que os outros já são”[8]. Desse feito, pode-se dizer que o outro nos ajuda a formar quem somos. Os versos célebres do poeta inglês do séc. XVII, Jonh Donner, enriquecem ainda mais a reflexão levantada por CASSARRO acerca da essência social do homem:
Nenhum homem é uma ilha,
Sozinho em si mesmo;
Cada homem é parte do continente,
Parte do todo;
Se um seixo for levado pelo mar,
A Europa fica menor,
Como se fosse um promontório,
Assim como se fosse uma parte de seus amigos ou mesmo sua;
A morte de qualquer homem me diminui,
Porque eu sou parte da humanidade;
Meditações XVII
Ao contrário do que afirmava o mito da solidão, o homem não pode viver sozinho, “nenhum homem é uma ilha” daquelas isoladas no Pacífico. Ele está imerso na cultura – esta funciona como cimento social que nos une. Cada um de nós é “parte do todo”, “parte da humanidade”. Essa constitui nossa força. CASSARRO afirma que “desde as eras pré-históricas nos organizamos em equipes” (2001:1). Esse tipo de comportamento visa facilitar a obtenção de alimentos, proteção, enfim, a sobrevivência. Assim, quando os componentes de um conjunto têm indicações claras de suas tarefas e atribuições, temos uma organização.
Embasando melhor o que acabamos de afirmar citemos CHIAVENATO:
Quase todo o processo produtivo é realizado dentro do que chamaremos de organizações, o que, sem dúvida, caracteriza a época em que vivemos. As pessoas passam a maior parte de seu tempo dentro de organizações, das quais dependem para nascer, viver, aprender, trabalhar, ganhar salário, curar suas doenças e obter todos os produtos e serviços de que necessitam. Uma das razões que explicam a enorme variedade e diversidade de organizações no mundo atual é o fato de serem o mais eficiente meio de satisfazer um grande número de necessidades humanas. Em virtude de suas limitações físicas, biológicas e psicológicas, o ser humano busca, por meio da cooperação com seus semelhantes, a conjugação de esforços para atingir objetivos que, sozinho, não teria condições de atingir ou, mesmo que as tivesse seria muito complexo atingi-las individualmente com suas forças e recursos, e talvez levasse muito mais tempo e consumisse muito mais esforços. As organizações surgem dessa necessidade primária de cooperação. Afinal, a união faz a força. Toda organização é composta de duas ou mais pessoas que interagem entre si por meio de relações recíprocas, para atingir objetivos comuns (2008:4).
Para CASSARRO, não se trata apenas de união de esforço, mas também de aperfeiçoamento dos meios: “desde o surgimento da primeira organização, da primeira ‘empresa’, o homem vem desenvolvendo tecnologia, a forma de técnicas, método e equipamentos para poder cumprir mais adequadamente suas atribuições” (2001:2). A título de ilustração o autor cita o papel dos feiticeiros da pré-história: intercediam pela comunidade junto aos deuses e tentava aplacar sua ira sobre o povo, eles desenvolveram uma série vestimentas, máscaras, ritos e instrumentos que os auxiliassem no cumprimento de suas funções (Ibidem). Historiadores como ARRUDA & PILETTI elencam os principais avanços do homem dito pré-histórico:
Uma descoberta-chave nesse período foi o domínio do fogo. Estima-se que o fago passou a ser controlado pela humanidade há 500 mil anos, na África oriental. Com seu controle, os seres humanos tornaram-se mais independentes da natureza, pois passaram a aquecer o ambiente em que viviam, a cozinhar os alimentos, a melhorar a proteção etc.
Os instrumentos utilizados, a princípio, eram de ossos e madeira; depois, de pedra e marfim. Utilizava-se também um machado de pedra afiada. Com as lascas, fabricavam-se facas e outros instrumentos pontiagudos. Por isso, o período também é conhecido como Idade da Pedra Lascada (1999:10)
No período subseqüente da aventura dos primeiros hominídeos, o Neolítico (8000 a.C. a 5000 a.C.), os homens desenvolvem a agricultura e com isso ocorre uma série de mudanças em seu modo de vida:
Os grupos humanos passaram a domesticar alguns animais, surgindo, por exemplo, os pastores de ovelhas. Surgiram os primeiros aglomerados populacionais, com finalidade principalmente defensiva; por isso, esses aglomerados eram cercados de fossos e paliçadas (...) Para armazenar cereais, faziam potes de barro, dando origem à cerâmica. Começaram a fabricar também os primeiros tecidos de lã e linho, em substituição aos trajes confeccionados com peles de animais (ARRUDA & PILETTI, 1999:11).
Com o tempo o ser humano aprendeu a modelar os metais e, com isso, novos avanços tecnológicos foram surgindo até chegarmos na chamada Era Tecnológica ou Era da Informação.
Não pensemos que a divisão das funções é uma coisa restrita àquelas sociedades arcaicas, mas permeou toda história da humanidade. A título de exemplo citemos o caso da sociedade feudal, cuja divisão clássica dos estratos sociais se resumiriam: naqueles que governam (representados pela nobreza), nos que rezam (o clero), nos que combatem (os cavaleiros) e nos que trabalham (os servos e escravos). Também na organização empresarial cada colaborador tem, ao menos, uma atribuição, um papel dentro da entidade jurídica: ao nível estratégico, têm-se a alta direção, ao nível tático, a gerência e, por fim, os funcionários no nível operacional.
[1] TELES, Maria Luiza S. O que é psicologia – coleção primeiros passos, 222.São Paulo: Editora Brasiliense, 2008 p. 20.
[2] ALVES, Rubem. O que é religião? São Paulo: Ed. Loyola, 1999 (8ª Ed.) p. 17.
[3] Idem, p. 18
[4] LARAIA, Roque B. Cultura: um conceito antropológico. Rio de Janeiro: Zahar, 1986 p. 43.
[5] Idem, p. 42.
[6] Extraído do site: http://pt.wikipedia.org/wiki/Robinson_Crusoe
[7] Extraído do site: http://es.wikipedia.org/wiki/Antonio_Abad (em espanhol)
[8] MELO, Fábio. Quem me roubou de mim? – o seqüestro da subjetividade e o desafia de ser pessoa. São Paulo: Editora Canção Nova, 2008, p. 60.
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